Antropologia Visual
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Browsing Antropologia Visual by Sustainable Development Goals (SDG) "10:Reduzir as Desigualdades"
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- Colá S. Jon, oh que sabe! : as imagens as palavras ditas e a escrita de uma experiência ritual e socialPublication . Ribeiro, José; Rocha-Trindade, Maria Beatriz; Piault, Marc-HenriQuando iniciei, no Bairro do Alto da Cova da Moura, o trabalho que deu origem a esta tese, apercebi-me que era ali que os tambores se poderiam reinventar, que os ritmos anteriormente vividos ou escutados se recriavam na batida do pilão, na forma de fazer rapé, no funaná, na música rap ou no Colá S. Jon. Foi neste contexto ambíguo de construções culturais simultaneamente reflexivas e experienciais que procurei uma estadia longa no terreno, a passagem para o interior do bairro, espaço-tempo da pesquisa, a construção de um objeto de estudo e de um percurso metodológico. A experiência de campo mostrava-se-me como um processo dialéctico e dinâmico, como construção dialógica e pragmática, através da qual trabalhava o terreno como um meio simultaneamente de comunicação e conhecimento e procurava encontrar nos métodos modos de reconstrução das condições de produção dos saberes. Residia aí o problema do espaço afetivo e intelectual, vital e ao mesmo tempo cognitivo, que é a observação de terreno enquanto diálogo e processo de palavra. Havia que ter em conta a experiência pragmática e comunicativa de terreno, através das resistências e da receção afável, dos mal entendidos e compromissos, dos rituais interativos, da tomada de consciência da observação do observador, que estão na base da construção e da legitimação do terreno como espaço-tempo da pesquisa. A inserção no terreno permitiu-me a viagem por muitos temas possíveis, por muitas áreas de investigação. O percurso realizado conduziu-me a este trabalho que constitui uma abordagem dos processos de produção e reprodução de um ritual cabo-verdiano, Colá S. Jon, na Cova da Moura, um dos bairros da periferia urbana de Lisboa. A tese é uma construção etnográfica, por comparação e contraste, de múltiplos fazeres, (re)fazeres a muitas vozes. Vozes dos que o fazem, repetem, dizem. Vozes do quotidiano ou escrita de poetas que o consideram, “prenda má grande dum pôve e que tá fazê parte de sê vida”(Frusoni). Saber dos antropólogos que o dizem “imagem e metáfora da forma como os cabo-verdianos se representam”, modo como se contam a si, para si, para os outros. É também representação de uma comunidade que se explica a si mesma, e ao explicar-se se constrói para si e para os outros a partir de dois eixos, de duas histórias que simultaneamente se cruzam e diferenciam: uma explicitada pelas palavras e simbolizada pela dança do colá, veiculando o contexto social e cultural das interações e dos processos sociais; outra sugerida pela dança do navio, representando a historicidade de um povo - o cruzamento dos destinos de homens e mulheres que atravessando os mares atraídos pela aventura, arrastados ou empurrados pela tragédia se juntaram e plantaram na terra escassa e pobre das Ilhas, no centro do Atlântico, daí partindo ainda hoje, numa repetição incessante do ciclo da aventura, da tragédia ou da procura, na “terra longe”, da esperança de uma vida melhor. A reconstituição do Colá S. Jon, fora do país de origem, confrontada com outras realidades sociais adquire, neste contexto, novas dimensões e sublinha outras já existentes. Adquire a forma elegíaca da recordação, espécie de realidade ontológica da origem fixada num tempo e num espaço; a de lugar de tensão dialéctica com a sociedade recetora no processo migratório e de consciência reflexiva da diversidade e alteridade resultante do encontro ou do choque com outra cultura; a de simulacro tornando-se objeto repetível, espetáculo em que ressaltam sobretudo a forma estética ou força dramática, um real sem origem na realidade ou produto de outra realidade, a da praxis ou conveniência política distante da participação dos seus atores. A tese coloca-nos perante o questionamento, o olhar reflexivo, da pesquisa antropológica: simultaneamente experiência social e ritual única, relação dialógica com os atores sociais, processo de mediação, de comunicação, e a consequente dimensão epistemológica, ética e política da antropologia. Coloca-nos também perante a viagem ritual - passagem ao terreno, à imagem e à escrita – e a consequente procura de reconhecimento e aceitação do percurso realizado. O processo de produção do filme Colá S. Jon, Oh que Sabe! completa-se com o da escrita, síntese de uma experiência e aparelho crítico do filme. Ambos tem uma matriz epistemológica comum. Resultam da negociação da diferença entre o “Eu” e o “Outro” e da complexa relação entre a experiência vivida no terreno, os saberes locais, os pressupostos teóricos do projeto antropológico. Ao mesmo tempo que recusam a generalização, refletem uma construção dialógica, uma necessária relação de tensão e de porosidade entre experiências e saberes, uma ligação ambígua entre a participação numa experiência vivida e a necessária distanciação objetivante que está subjacente em qualquer atividade de tradução ou negociação intercultural, diatópica.
- Filme e hipervídeo : um retrato polifónico da geração dos Capelinhos a partir da emigração e regressoPublication . Saraiva, António João; Ribeiro, José da SilvaOs Açorianos nascem nas suas ilhas marcados pela inevitabilidade da partida: “Nascemos já preparados para a partida”, dizem-nos na ilha de S. Jorge. Sismos, dificuldades económicas, escassez de terra estão na origem desta circunstância. A geografia a sobrepor-se à história, como sublinhava Vitorino Nemésio. Uma fatalidade na partida que tem associada a ideia de regresso. Partida e regresso fazem parte das narrativas açorianas no romance, no conto ou na música. Uma vez na diáspora, o regresso (ou o desejo de regressar) permanece. “Ricos ou desiludidos pretendem voltar. O ideal do Açoriano é formar lá um pecúlio e vir depois gozá-lo na sua ilha querida”, diz-nos mestre Leite de Vasconcelos depois de uma saudosa visita às ilhas em 1926. Muito frequentemente, o regresso acaba por não se concretizar, principalmente por razões familiares. Um conflito que a expressão “minha terra minha dor, meu filho meu amor” bem expressa. Os processos migratórios originam sempre novos territórios culturais, desde logo pela desterritorialização (perda da relação natural com o território cultural de origem). A adaptação cultural que ela obriga desencadeia fenómenos de reterritorialização ou, por outras palavras, processos de adaptação a novos territórios, originando novas ilhas açorianas em terras da América. O arquipélago prolonga-se para lá da ilha do Corvo. Outras ilhas existem mais a ocidente. Este estudo centra-se na questão do regresso a partir da vaga migratória dos Capelinhos, nome com que ficou conhecida a geração que emigrou na sequência da erupção dos Capelinhos, em 1957, e que está hoje na idade de reforma e, por isso, com possibilidade de voltar. Com uma permanência longa, de várias décadas, em terras novas, as suas raízes estão divididas entre a terra onde nasceram e onde se encontram as suas memórias de infância, e a Califórnia, onde viveram vidas ativas e onde nasceram os filhos e os netos. “A terra dos nossos filhos é também a nossa terra”, dizem-nos em S. José (Califórnia). A terra velha terá ficado para trás. O texto apresentado será, nos aspetos essenciais, intencionalmente multidiscursivo e polifónico (múltiplas vozes), tomando caraterísticas diferentes que passarão pela etnohistória, narrativas pessoais biográficas, descrições pormenorizadas da vida quotidiana de famílias, com o propósito de apresentar um texto que pretendemos seja uma alegoria sobre o regresso (allegoria, de allos “outro” + agoria “discurso”). Refletiremos também sobre o contributo e as especificidades de um trabalho de observação mediado por câmara e sobre o contributo do filme etnográfico e do hipervídeo enquanto discursos narrativos que concorrem com o texto para a compreensão do regresso e da Açorianidade. Apresentaremos seis casos de estudo (seis famílias), que foram objeto de acompanhamento durante dois meses de trabalho de campo em S. Jorge (Açores) e nove meses em S. José (Califórnia). Com este trabalho, que inclui a produção de um documentário e de um hipervídeo, estudámos o modo como o desejo de regressar é vivenciado nos quotidianos, acrescentando conteúdos para um retrato polifónico do regresso, que pretenderá juntar-se a um álbum de outros retratos sobre a Açorianidade. A escrita, o audiovisual, o hipervídeo não são, pois, discursos e narrativas separados mas resultam numa cultura de convergência dos média e dos conteúdos.
- Imagens das migrações : chineses na área metropolitana do Porto : do ciclo da seda à era digitalPublication . Nunes, Maria Fátima Ferreira; Ribeiro, José da SilvaO presente trabalho incide sobre uma tripla problemática: a Antropologia Visual visando uma metodologia específica de inquérito (visual e sonoro) e a apresentação dos resultados em forma de discurso visual e/ou audiovisual, as representações mentais, visuais e audiovisuais (filmes, media) acerca da problemática das migrações e da escola, isto é, o cinema como terreno, e a imigração chinesa em Portugal, em duas temporalidades e contextos sociais, políticos, económicos muito distintos: o final dos anos vinte, do século passado e os anos oitenta do mesmo século. A «viagem» teórica, mental, física, durante o percurso que termina aqui, apresenta cinco capítulos: «O Acaso e a Experiência das Imagens em Antropologia», «A Escrita e a Montagem como Processo de Investigação?», «Migrações Globais. Para uma Antropologia Transnacional», Imigrantes Chineses na Área Metropolitana do Porto. O «Ciclo da Seda», «A Nova Imigração Chinesa. A Era Digital». Deste caminho longo, resultou a escrita de «Imagens das Migrações. Chineses na Área Metropolitana do Porto. Do Ciclo da Seda à Era Digital», tecida com uma multiplicidade de conceitos, de vozes: a dos interlocutores com quem interagi no terreno, que tinham histórias para contar a partir da experiência vivida ou de imagens da memória dos seus ascendentes; a dos antropólogos que reflectiram e avançaram epistemológica, metodológica, heuristicamente, a partir do trabalho de campo que desenvolveram; a dos historiadores que analisaram a sociedade portuguesa e chinesa em épocas distintas; a dos sociólogos que reflectiram sobre os fenómenos sociais actuais, a dos cineastas, que representaram, com imagens, a forma de ver o seu país em momentos sociais, políticos e culturais importantes, as migrações, a escola…; a dos poetas que expressaram seus sentimentos e o pulsar do quotidiano, dos pormenores. Resultaram também dois documentários: «Pioneiros, palavras e imagens da memória», e «Só Quer Sair, Só Quer Sair… Uma história da imigração chinesa».