Mestrado em Estudos Sobre as Mulheres - Género, Cidadania e Desenvolvimento | Master's Degree in Women Studies - TMEMU
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Browsing Mestrado em Estudos Sobre as Mulheres - Género, Cidadania e Desenvolvimento | Master's Degree in Women Studies - TMEMU by advisor "Beleza, Teresa"
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- Um olhar por Grécia e contemporaneidade : sobre a construção masculina de cidadePublication . Rilho, Maria Fernanda; Joaquim, Teresa; Beleza, TeresaResumo - Raízes históricas da cidadania hyphen das mulheres. A Cidade é uma comunidade histórica baseada numa ideia de paridade: um corpo cívico que não tem nenhum superior jurídico. Mas é um núcleo restrito, a vários níveis. A polis grega é um “clube de homens" em que nem todos os machos livres são considerados idóneos para governar e guerrear. Por isso, em todas as poleis, o sentido mais elevado do “direito de cidade" é o acesso à participação activa nas escolhas, decisões, administração e controle da coisa pública. Contudo esse clube também socialmente restrito ir-se-á alargando, numa evolução secular, à medida que se transforma a relação de forças. A oligarquia da nobreza fundiária parece obrigada a reconhecer um lugar à riqueza mobiliária e até, por fim, à pobreza que permanecera longamente uma tara irremediável. Mas atenção, a igualdade jurídica não impede que os pobres permaneçam cidadãos passivos. É então preciso efectivar politicamente a igualdade. Tal só acontece a partir da revolução democrática que, ao pretender que todos os cidadãos sejam activos, tende a associar liberdade a igualdade. Apenas a partir de então se demonstra que toda a ordem assenta sobre uma decisão e não sobre uma norma. Só a partir de então se pode aprender que a completa interligação das várias dimensões da cidadania depende de diferentes concepções e práticas de democracia. Porém, até ao fim do ciclo histórico da polis, o alargamento da cidadania depende de juízos contingentes, não de direitos categóricos, e esses juízos não levam nunca a uma inclusão universal. Todavia, a alforria e a adopção cívica comprovam, não pela rara frequência mas pelo princípio, que alguns estatutos marginalizados (os do escravo, bastardo ou imigrante) são modificáveis. Intransponível é o de “mulher de Atenas". Elas são sempre não-cidadãs ou, melhor dizendo, infra-cidadãs na medida em que pertencem à polis. Parece que a oposição dos sexos é princípio estruturante da Cidade. Não sem resistências, note-se. Uma visão homogénea e uniforme do corpo político, associada ao “bem comum" ou “interesse geral", é também determinante na cidade moderna. Os defensores do sufrágio universal ou da soberania popular comungam quase todos uma visão muito restritiva da noção de “povo". Limitando-a aos seres machos, brancos, cristãos, proprietários e presumidos heterossexuais. Uma polaridade com a diferença armadilha a concepção da igualdade tanto na cidadania antiga como na moderna. Assim, a humanidade como sujeito e fonte de direitos é (mais frequentemente) concebida e interpretada como norma dominante. Esta confunde a sua própria particularidade com o universal e exclui grupos sociais inteiros. Diz-se que esses outros e outras não são nem autónomos nem independentes. O desnível entre indivíduos nascidos livres e a “mulher" naturalmente submetida alarga e consolida-se no s. XIX. A exclusão feminina dos direitos civis e políticos, e dos económicos depois, veda o acesso ao político e ao mercado de trabalho. Pretende-se uma intensa domesticação, para bem da natureza e da família. A situação das ocidentais regride para um degrau comparável ao das mulheres de Atenas. Com resistências, umas individuais e outras colectivas desse novo actor social que é o movimento feminista. No decorrer do processo histórico parece ter-se tomado consciência de que um meio para a coesão social é o alargamento da cidadania. Mas a sequência da obtenção dos direitos cívicos é mais ou menos inversa da dos homens. Para elas são os sociais os primeiros a ser possuídos, como por exemplo a protecção da maternidade, sem que detenham direito de voto e muitas das liberdades pessoais. A lógica é a de que elas são politicamente excluídas mas socialmente assistidas. Portugal vive as mudanças históricas da instauração da I República e da Ditadura com conta-gotas a dosear a melhoria da situação das mulheres. Só a Revolução da II República (1974) acelera um pouco a dinâmica mas de forma ambígua. Coexistem emancipação e discriminação. O saldo democraticamente deficitário da cidadania das mulheres, no início do novo milénio, é nítido. Emancipada de jure, a sua situação de facto traduz uma sub-cidadania. Parece que elas foram adicionadas a uma cidade presente herdeira do passado: a lógica estrutural é a exclusão de princípio. Não basta mudar regimes políticos, governantes e leis. Pode ser condição necessária mas (manifestamente) não suficiente. O carácter sistémico das opressões origina que elas sejam reproduzidas nas mais importantes instituições políticas, económicas e culturais. E, enquanto esse carácter sistémico não for destruído, a situação das mulheres continua a dar ‘2 passos à frente e 1 à retaguarda’, ou vice-versa. A carência de poder político das portuguesas (e ocidentais, dizem-nos) não é um pormenor mas sim um expoente: o poder é uma relação mais do que uma coisa. É precisa uma mudança civilizacional que altere as relações sociais, promovendo condições institucionais necessárias para o desenvolvimento e o exercício das capacidades individuais, da comunicação colectiva e da cooperação. Parece pois pertinente propor, para uma cidadania plena (paritária ou mista, como lhe quiserem chamar), um propósito de justiça social cujo conceito seja coextensivo ao de político. Entendido no sentido que abrange todos os aspectos da organização institucional, a acção pública, as práticas e hábitos sociais, os significados culturais, na medida em que estão potencialmente submetidos a avaliação e tomada de decisão colectivas. As cidadanias antiga e moderna são sem dúvida revoluções, mas incompletas e enviesadas. A cidade como comunidade inclusiva de igualdade-liberdade na dissemelhança está por construir. É fundamental, para outra relação de forças, que as mulheres estejam na primeira fila do político: a de acção (praxis) e discurso (lexis)